Muita gente acha (ou pensa que acha) que a civilização está à beira de um colapso. No mês passado mesmo o Mensageiro Sideral abordou um estudo que sugere a possibilidade de que estejamos numa rota de autodestruição.
Parece-me, portanto, muito apropriada a iniciativa de uma fundação nos
Estados Unidos: eles estão começando a montar um “Manual para a
Civilização”.
O projeto foi oficialmente iniciado em fevereiro e tem por objetivo
selecionar cerca de 3.000 livros, dentre todos já escritos ao longo da
história humana, para preservação.
“Batizamos essa coleção de Manual
para a Civilização, e ela incluirá os livros que você mais iria querer
para reconstruir a civilização”, afirma Alexander Rose, diretor
executivo da Long Now Foundation.
A coleção será acondicionada em uma instalação que a Long Now está
construindo em San Francisco. Além de servir como sua sede, o local será
ao mesmo tempo biblioteca, bar, museu e cafeteria, aberto ao público e
destinado a receber pequenos eventos.
Adicionalmente, a fundação fez uma
parceria com o Internet Archive, que guardará digitalmente os livros.
COMBINANDO CONTEÚDOS
“Que livros são esses? Para garantir que não vamos pegar só um
punhado de livros sobre como fazer fogo, distribuímos a coleção em
quatro categorias básicas para ajudar a guiar o processo de coleção”,
diz Rose.
São elas: cânone cultural (grande literatura, livros historicamente
importantes, reunindo gente como Shakespeare e Platão), mecânica da
civilização (conhecimento técnico, como construir e compreender coisas),
ficção científica rigorosa (que conta histórias úteis sobre futuros
potenciais) e livros ligados a pensamento de longo prazo, futurismo e
história (seguindo a linha de que conhecer o passado ajuda a refletir
sobre o futuro).
Algumas figurinhas carimbadas da nossa civilização ajudarão a
selecionar o títulos.
Dentre elas, figuram Kevin Kelly, um dos criadores
da revista “Wired”, Neal Stephenson, o escritor de ficção científica, e
a astrofísica Jill Tarter, campeã da pesquisa SETI (Busca por
Inteligência Extraterrestre).
Naturalmente, os associados da Long Now também podem sugerir títulos.
Até agora, os organizadores atingiram cerca de 1.400 indicações, e a
ideia é chegar até 5.000, para então fazer uma seleção criteriosa e
fechar com os 3.000 livros mais bacanas — processo que será realizado
por meio de votação.
Um dos títulos da coleção, contudo, já está definido: é o Disco de
Roseta, iniciativa da Long Now que precedeu o atual projeto e que fez um
belo registro das variadas línguas humanas.
A famosa Pedra de Roseta, para quem não é muito chegado em história,
foi uma tábua do século 2 a.C. que continha o mesmo texto escrito em
demótico, grego e hieróglifos.
Foi o que permitiu que o arqueólogo
Jean-François Champollion finalmente traduzisse a linguagem
hieroglífica, em 1882.
O Disco de Roseta é uma versão moderna desse artefato histórico e foi
feito para durar. Construído em níquel, ele contém 13 mil páginas de
informação listadas em 1.500 línguas.
Mas não pense você que é um disco
de dados, como os nossos CDs. O texto está grafado fisicamente na
superfície do disco e pode ser lido com um microscópio capaz de
propiciar aumento de 650 vezes.
Além de estar disponível na Terra, o disco foi embarcado na sonda
europeia Rosetta, lançada em 2004 e destinada a encontrar o cometa
67P/Churyumov-Gerasimenko em meados deste ano.
Ela passará milhares de
anos orbitando o Sol desimpedida, preservando a herança cultural das
línguas humanas por um período indefinido de tempo.
Até pela presença do Disco de Roseta como livro número 1 do “Manual
para a Civilização”, a Long Now não está se limitando a títulos em
inglês para a coleção completa. Esperemos que algumas obras brasileiras
cheguem a compor a seleção. Machado de Assis mereceria, penso eu.
Mesmo que nossa sociedade jamais sofra um colapso no futuro, o
“Manual para a Civilização” soa como uma iniciativa muito boa.
Além de
ser uma biblioteca que todo leitor interessado gostaria de ter,
trata-se, por exemplo, de uma ótima mensagem para transmitirmos a
civilizações alienígenas, caso consigamos estabelecer contato por rádio.
Algo como o verbete sobre nós na “Enciclopédia Galáctica” de Carl
Sagan…
Mensageiro Sideral
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