Da Exame
Como funciona a estrutura montada pela
Petrobras para treinar 9 000 funcionários até 2014 — e, assim, garantir
a exploração das reservas do pré-sal.
Roberta Paduã
Poucos episódios mudaram tanto a
trajetória de quase seis décadas da Petrobras, a maior empresa
brasileira, com faturamento de 213 bilhões de reais no ano passado,
quanto a descoberta de petróleo no pré-sal em 2007.
Se conseguir de fato extrair petróleo
de rochas enterradas a mais de 7 000 metros de profundidade no meio do
Atlântico, a Petrobras dobrará sua produção diária, de 2,5 milhões para 5
milhões de barris de petróleo até 2020.
As perspectivas de tamanho crescimento
possibilitaram que a companhia levantasse 120 bilhões de reais no ano
passado, na maior capitalização da história.
Também colocaram a estatal brasileira
como a oitava maior empresa do planeta, segundo a revista Forbes, que
avalia receita, lucro, valor de mercado e ativos de mais de 2 000
corporações.
Além de desenvolver tecnologias
capazes de vencer a pressão, a temperatura e a dureza das rochas no
caminho para os reservatórios do pré-sal, a Petrobras precisará de
gente, muita gente, para alcançar essa meta.
Até o final de 2014, a companhia terá
de recrutar 9 000 funcionários e oferecer treinamento a eles e às 80 000
pessoas que hoje fazem parte de seus quadros.
Trata-se de uma tarefa complexa não
apenas pela quantidade de pessoas envolvidas mas também pela qualidade
do treinamento necessário — boa parte desse pessoal exerce funções
específicas do setor de petróleo e gás, um mercado que durante décadas
foi monopólio estatal.
A Petrobras não pode “roubar”
funcionários de concorrentes — é ela que perde gente para petroleiras
novatas, como a OGX, de Eike Batista, que buscou vários profissionais na
estatal, incluindo seu atual presidente, Paulo Mendonça. Seu processo
de contratação não segue o roteiro das empresas privadas.
A Petrobras só pode admitir
funcionários por concurso público — e em nível júnior. “Não escolhemos
nossos funcionários. Nós é que somos escolhidos”, afirma Mariângela
Mundim, gerente de planejamento de recursos humanos da companhia.
Segundo Mariângela, os concursos são
como pescarias de arrastão: “Quando puxamos a rede, encontramos
lagostas, camarões e peixes nobres, mas, às vezes, também vêm uma lata
amassada, uma bota furada, além de chegar todo mundo cru”.
Com tantas limitações, a Petrobras
teve de se transformar numa espécie de máquina de formar mão de obra
para se manter competitiva. No ano passado, investiu 161 milhões de
reais em educação corporativa, média de 2 000 reais por empregado por
ano. Para o padrão brasileiro, o investimento é altíssimo. Comparado com
o que é feito em multinacionais como a GE, nem tanto.
A empresa americana investe mais de 1
bilhão de dólares por ano na preparação de seus funcionários em todo o
mundo — o equivalente a 5 300 reais por cabeça.
“A Petrobras consegue formar não
apenas bons técnicos mas também bons líderes, o que é fundamental para
uma organização que só contrata juniores”, diz Glaucy Bocci, sócia do
Hay Group, consultoria responsável pela elaboração de um ranking anual
de empresas com as melhores práticas de desenvolvimento de líderes. (Em
2010, a Petrobras ocupou a sexta posição na lista.)
Essa é uma das razões pelas quais a
estatal também consegue atrair estudantes universitários e jovens
profissionais. Entre 2005 e 2009, liderou o ranking A Empresa dos Sonhos
dos Jovens, feito pelo grupo DMRH — no ano passado, a estatal foi
desbancada pelo Google.
“Esses jovens enxergam na Petrobras
uma empresa que trabalha com tecnologia de ponta, paga bem, investe na
formação do empregado e dá chance de ele crescer, além, é claro, de
atrair quem deseja segurança no emprego”, diz Sofia Esteves, do DMRH.
(Os funcionários da estatal são contratados seguindo o regime da CLT,
mas as demissões são raríssimas.)
O pontapé inicial da política de
treinamento da Petrobras são os chamados “cursos de formação”,
obrigatórios para todos os novos funcionários.
No ano passado, 2 215 profissionais
participaram desses programas, que duram de duas semanas a um ano,
dependendo do cargo do profissional, e acontecem, na maioria das vezes,
na Universidade Petrobras, prédio de oito andares localizado próximo à
sede da empresa, no centro do Rio de Janeiro.
Engenheiros, por exemplo, passam 13
meses em sala de aula antes de começar a trabalhar; administradores de
empresas, quatro. A capixaba Tainá Cosme, de 23 anos, é exemplo típico
do tratamento a que os novatos são submetidos.
Formada em engenharia química na
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Tainá foi admitida em março de
2010, mas só começou a trabalhar, de fato, na área de estudos de
projetos petroquímicos, há cerca de um mês. Antes disso, passou 13 meses
assistindo a 8 horas diárias de aulas em disciplinas técnicas, de
segunda a sexta-feira — e ainda tinha de estudar para as provas
semanais.
Detalhe: durante o curso, todos os
“alunos-funcionários” recebem salário e têm direito aos benefícios. Os
que não atingem a média obrigatória (6) são dispensados. No ano passado,
nove pessoas foram demitidas. Em 2007, 79 — um recorde para a
corporação. Tainá passou com folga — sua média foi 8,4.
Os treinamentos não acabam depois
desse “teste” na entrada. Ao longo da carreira, os funcionários da
Petrobras são submetidos a diversos cursos de educação continuada. No
ano passado, mais de 2 500 cursos diferentes foram realizados na
empresa, somando 5 milhões de horas-aula.
Nem todo o conteúdo dessa programação é
desenvolvido pela universidade corporativa. Em 2010, por exemplo, a UP
contratou 49 instituições e professores estrangeiros para ministrar
cursos, entre eles especialistas em rochas carbonáticas, comuns no
pré-sal e ainda pouco conhecidas no Brasil, vindos das universidades de
Parma, na Itália, e de Michigan, nos Estados Unidos.
Com tantas opções de cursos e com
tanta gente envolvida é preciso ter critérios para definir quem faz o
quê. A seleção dos funcionários que participam dos cursos de educação
continuada é feita com base em um programa chamado Gerenciamento de
Desempenho — uma avaliação de desempenho obrigatória para todos os
empregados que acontece anualmente no mês de junho.
“É o momento em que subordinados e
chefias avaliam o desempenho até ali, conversam sobre as metas
atingidas, definem novos objetivos e discutem o tipo de treinamento que
deveria ser feito”, afirma Diego Hernandes, diretor de RH da Petrobras.
“Não fazemos treinamento porque é moda, mas porque queremos melhorar
nossos resultados.”
Ilustrações: Blog Mundo Real e Virtual
Ilustrações: Blog Mundo Real e Virtual
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