quinta-feira, 1 de agosto de 2013

As origens ideológicas do Plano Real

Sugerido por Assis Ribeiro
A globalização em sua forma perversa. No neoliberalismo os mercados substituem os Estados, trazendo estagnação da economia, concentração de renda, miséria e exclusão social.
Da Editora Alfa-Omega
A Ideologia do Plano Real exposta em novo lançamento da Editora Alfa Omega
André Araújo
Entrevista com o Autor
Pergunta: Qual é a tese central de seu novo livro sobre os mercados e a globalização?

André Araújo: Tento mostrar como o processo de substituição dos Estados pelos mercados levou os países em desenvolvimento a um impasse no crescimento, criando uma inédita estagnação da economia, concentração de renda, miséria e exclusão social. 
Pergunta: Na sua visão, por que isso ocorreu e quando começou o processo? 
André Araújo: Os vastos territórios fora do Grupo dos Sete compreendem 90% da população mundial. É da expansão do mercado financeiro para essas regiões que vêm o dinamismo e o bem estar das economias maduras, através das elevadas taxas de risco e da alta rentabilidade proporcionada pela manipulação das economias fragilizadas e carentes de liquidez. O processo iniciou-se, historicamente, a partir do Governo Thatcher, na Inglaterra (1979), influenciando o Governo Reagan, nos Estados Unidos, o qual absorveu o neoliberalismo vindo da Inglaterra e consolidado no fim dos anos 80 com a queda da União Soviética e a conseqüente eliminação do risco político do capitalismo financeiro.
Pergunta: Não é o neoliberalismo, porém, um fenômeno natural do atual ciclo histórico?
André Araújo: O neoliberalismo não é uma verdade científica, mas uma grosseira ideologia de dominação política. A roupagem acadêmica de fenômeno inevitável é apenas a moldura para um fato do campo da "Realpolitik", ou seja, do jogo pesado das relações internacionais. É muito mais Política do que Economia.
Pergunta: Todavia, não é impossível, a um país, a não-participação da globalização? 
André Araújo: O que se chama globalização é, na verdade, uma política dos grandes países com moedas conversíveis (o G-7) , para obrigar todos os outros - mais fracos economicamente - a abrirem seus mercados de bens e serviços, principalmente na área financeira. A forma da participação de cada país depende da força e consistência de sua liderança política. Quatro grandes países continentais têm massa crítica para ditar suas próprias regras de inserção no processo de globalização, ou se preferirem, para manter sua integridade de fronteiras fechadas, pois podem crescer a partir de seu mercado interno. São eles a Rússia, a China, a Índia e o Brasil.
Pergunta: Então a abertura econômica não traz o crescimento? 
André Araújo: Essa é a mercadoria vendida pelos neoliberais, mas nunca será entregue. A abertura dos mercados ao sistema financeiro internacional tem sido um desastre total àqueles países que mais se abriram: Argentina, Indonésia, Equador, Brasil e Peru. Salvaram-se, com altas taxas de crescimento, os que preservaram seu controle sobre o câmbio e sobre o comércio exterior , ou sejam, a Índia e a China. A prova dos nove do sucesso das políticas econômicas é o crescimento do P.I.B. A segunda prova é o bem estar social e a distribuição de renda. Por essas medidas, as aberturas de mercado são desastres históricos. O Plano Real reduziu o P.I.B. de US$ 800 bilhões, em 1994, para US$ 530 bilhões, em 2001. Ao mesmo tempo, a dívida externa triplicou, a interna aumentou dez vezes e o patrimônio público foi quase todo vendido. Poucas vezes a história econômica registrou desastre maior. Ao basear toda a economia no setor externo, o Plano Real alienou a capacidade decisória do Estado Brasileiro e neutralizou sua elite empresarial - hoje sócia menor do capitalismo financeiro do hemisfério norte.
Pergunta: A expressão mercados soberanos significa que o mercado está acima dos Estados Nacionais? 
André Araújo: Não. O mercado financeiro é hoje adulado e incensado pelos países que optaram pela cartilha neoliberal, mas ele não está acima dos Estados Nacionais do Grupo dos Sete, dos quais os mercados dependem para sua projeção internacional. O mercado só é forte porque, na sua retaguarda, garantindo seus investimentos, está o poder político e militar dos Estados Unidos e da OTAN. , A Wall Street jamais desafiou o núcleo central de poder político dos Estados Unidos, a quem sempre obedeceu - o Federal Reserve, o Departamento do Tesouro e o Pentágono. Dizer que a Wall Street é independente, em relação ao Governo dos Estados Unidos, é como certos economistas brasileiros dizerem que o FMI é uma grande cooperativa onde todos os países são sócios, omitindo que o Tesouro Americano controla totalmente as decisões desse órgão , no qual os interesses americanos têm precedência sobre quaisquer outras considerações. Os mercados são soberanos, portanto, em relação aos países sem liderança política e que se colocaram sob seu poder ; mas, não estão acima dos grandes Estados Nacionais, os quais continuam tão fortes como sempre foram.
Pergunta: Qual a relação existente entre Mercados soberanos e seus outros livros?
André Araújo: O objetivo que une e dá continuidade à série, iniciada em 1991, é o debate do pensamento econômico fora do circuito dos economistas. No Brasil, nestes últimos dez anos, a discussão de temas econômicos fechou-se dentro de um núcleo restrito de profissionais - a maioria deles pertencente à corrente majoritária, dita do pensamento único, ou seja, do neoliberalismo globalizante. Isso é um grave erro dos meios acadêmicos e da imprensa. A economia interessa à toda sociedade e deve ser debatida como um fenômeno político, e não técnico, pois é muito mais importante analisar a correlação da economia com o futuro do País do que fazer uma abordagem exclusivamente financeira, que é exatamente o que hoje se faz nos meios de comunicação, e, ainda assim, de forma superficial e repetitiva. As idéias econômicas devem ser vistas a partir de suas raízes sociais e políticas. É isso o que meus livros tentam mostrar. E é somente dessa forma que a economia pode ser compreendida.

Fonte:

Nenhum comentário:

Postar um comentário