Por Leonardo Sakamoto
O projeto de lei que legaliza a contratação de prestadoras de
serviços para executarem atividades-fim em uma empresa entre outros
temas, está para ser votado, nesta semana, na Comissão de Constituição e
Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados.
De uma hora para outra,
a empresa em que você trabalha pode pedir para você abrir uma empresa
individual e começar a dar nota fiscal mensalmente para que ela fuja de
impostos e tributos.
O texto é um substitutivo de Arthur Maia (PMDB-BA) sobre o projeto 4330/2004 do empresário Sandro Mabel (PMDB-GO). A
votação vai ocorrer em caráter terminativo na CCJC, ou seja, aprovado,
deve seguir para o Senado.
Há deputados federais, associações de classe e
sindicatos que estão se organizando para fazer com que o assunto vá sim
a votação em plenário.
Centrais sindicais, que estão com seus
representantes para os corredores do Congresso, afirmam que o projeto
pode contribuir com a diminuição da qualidade de vida do trabalhador.
Reclamam que, transformado em lei, os chamados “coopergatos”
(cooperativas montadas para burlar impostos) e as pessoas-empresa (os
conhecidos “PJs”) irão se multiplicar e o nível de precarização subir.
A
CCJC recebeu, na semana passada, um parecer assinado por 19 dos 26
ministro do Tribunal Superior doTrabalho, criticando o projeto de lei e
alertando para as consequências negativas de sua aprovação.
”Ao permitir
a generalização da terceirização para toda a economia e a sociedade,
certamente provocará gravíssima lesão social de direitos sociais,
trabalhistas e previdenciários no País, com a potencialidade de provocar
a migração massiva de milhões de trabalhadores hoje enquadrados como
efetivos das empresas e instituições tomadoras de serviços em direção a
um novo enquadramento, como trabalhadores terceirizados, deflagrando
impressionante redução de valores, direitos e garantias trabalhistas e
sociais”, afirma.
E, em decorrência do PL, o parecer prevê que ”o
rebaixamento dramático da remuneração contratual de milhões de
concidadãos, além de comprometer o bem estar individual e social de
seres humanos e famílias brasileiras, afetará fortemente, de maneira
negativa, o mercado interno de trabalho e de consumo, comprometendo um
dos principais elementos de destaque no desenvolvimento do País.
Com o
decréscimo significativo da renda do trabalho ficará comprometida a
pujança do mercado interno no Brasil.” Outras cartas também foram
produzidas por juízes, procuradores e auditores fiscais do trabalho,
entre outras categorias, contra o projeto.
Vamos desenhar para não ficar sombra de dúvida:
-
Uma empresa, se assim desejar, poderá terceirizar não apenas a parte
secundária de suas atividades cotidianas (como limpeza, segurança,
administração predial…), mas todas elas, não permanecendo com qualquer
empregado.
Uma usina de cana sem cortadores empregados, uma empresa
jornalística sem jornalistas, uma empresa de engenharia sem engenheiros,
um banco sem bancário e por aí vai. Só PJs.
- Uma vez autorizada a
contratação de uma terceirizada para fazer a atividade principal de
determinada empresa, sem que esta empresa seja responsável pela situação
trabalhista dos terceirizados, você está deixando milhões de
trabalhadores no Brasil ao relento.
Pois o problema não é terceirizar,
mas poderá ser responsabilizada legalmente se houver problemas
trabalhistas. O projeto, do jeito em que está, acaba com a
responsabilização solidária por parte das tomadoras de serviço.
-
Fiscais que libertam escravos estão cansados de ouvir desculpas de
fazendeiros como: “Ah, mas ele não é meu empregado! Contratei aquele
sujeito para cuidar disso para mim”. E aponta para um “gato”
(contratador de mão de obra), roto e sujo, que foi obrigado a montar uma
empresinha mequetrefe para que o patrão fugisse de pagar os direitos
trabalhistas.
Hoje, o governo, o Ministério Público do Trabalho e a
Justiça do Trabalho dão um “perdeu, playboy” e o fazendeiro tem que
pagar o devido. Amanhã, com essa mudança, quem sabe.
- Quem irá
contratar uma pessoa que reclama, que fica grávida, que falta ao serviço
por problemas de saúde, que não abaixa a cabeça e atende a todo tipo de
ordem, que custa o dobro por conta de direitos como 13o salários,
adicional de férias, limite de jornada de trabalho e piso salarial?
-
Muitas empresas grandes irão preferir, ao invés de investir em
empregados diretos, contratar uma empresa terceirizada, que, por sua
vez, também irá contratar uma quarteirizada e que, em última análise,
contratará uma quinterizada.
Ou seja, um microempreendedor individual,
uma pessoa com sua nota fiscal por bloco ou eletrônica, sem que isso
possa ser considerado fraude.
- O substitutivo abre a
possibilidade de que trabalhadores que não exerçam a atividade-fim das
empresas contratadoras sejam representados por outros sindicatos,
normalmente com menos poder de negociação, criando empregados com menos
garantias.
- Toda a atividade econômica tem riscos. Se ela dá
errado, o empreendedor tem prejuízo. Se ela dá certo, lucro. O problema é
que, por aqui, o lucro é privatizado e o prejuízo socializado. A
aprovação da lei será exatamente isso: a externalização total dos riscos
sem que haja um mínimo de divisão dos lucros dela advindos, via
valorização do trabalho.
- Casos famosos de flagrantes de trabalho
escravo surgiram por problemas encontrados em terceirizados e a
responsabilização de grandes marcas que os contrataram. Com a nova lei,
isso será mais difícil.
Esse é o cenário com o qual sonharam os
banqueiros, industriais e demais grandes empresários de todas as épocas.
Todos os lucros e nenhuma responsabilidade.
E com o aval do poder
público, em nome da modernidade e da competitividade.
Faz-se necessário
regulamentar a terceirização do trabalho para proteger quem já está
nessa situação em atividades secundárias? Claro. Mas estão aproveitando
dessa desculpa para a aprovação de uma mini reforma trabalhista com
sérios prejuízos ao povão.
A batalha pelo bloqueio da 4330/2004 em
muito se assemelha ao processo da conhecida “Emenda 3″, que integrou o
projeto que criou a Super Receita, e propunha que auditores fiscais
federais não poderiam apontar vínculos empregatícios entre empregados e
patrões, mesmo quando fossem encontradas irregularidades.
Apenas a
Justiça do Trabalho, de acordo com o texto, é que estaria autorizada a
resolver esses casos. Na prática, a nova legislação tiraria o poder da
fiscalização do governo, o que dificultaria o combate às terceirizações
ilegais.
O Congresso Nacional aprovou a emenda, mas o então
presidente Lula a vetou em março de 2007. Na época, trabalhadores foram
às ruas para apoiar o veto – milhares de metalúrgicos fizeram passeatas
na região do ABC, metroviários cruzaram os braços e bancários
protestaram na capital paulista.
Com as manifestações, a medida foi
posta em compasso de espera, uma vez que assustaram deputados e
senadores favoráveis à medida.
A aprovação do projeto conta, hoje,
com o apoio do governo federal, que se ancora em uma mesa de negociação
quadripartite sobre a matéria, envolvendo trabalhadores, empresários,
governo e parlamentares, mas desequilibrada em favor dos empresários.
Não há consenso dentro da administração pública federal, mas, segundo
fontes ouvidas por este blog, o Planalto estaria fechado com as
mudanças.
E com o silêncio de algumas grandes empresas de
comunicação, que têm o dever democrático de ampliar o debate junto à
sociedade, expondo prós e contras.
Se você não ouviu, viu ou leu nada
sobre isso, saiba que muitas delas são parte interessada no tema e não
dirão patavina até que as mudanças estejam garantidas.
Fonte:
http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2013/09/03/com-o-apoio-do-governo-camara-deve-votar-projeto-que-diminui-protecao-ao-trabalhador/
Nenhum comentário:
Postar um comentário